sábado, 13 de fevereiro de 2016

A ansiedade

Não se deixando vitimar pela rotina, o homem tende, às vezes, a assumir um comportamento ansioso que o desgasta, dando origem a processos enfermiços que o consomem.

A ansiedade é uma das características mais habituais da conduta contemporânea.

Impulsionado ao competitivismo da sobrevivência e es­magado pelos fatores constringentes de uma sociedade etica­mente egoísta, predomina a insegurança no mundo emocio­nal das criaturas.

As constantes alterações da Bolsa de Valores, a compres­são dos gastos, a correria pela aquisição de recursos e a dis­puta de cargos e funções bem remunerados geram, de um lado, a insegurança individual e coletiva. Por outro, as amea­ças de guerras constantes, a prepotência de governos inescru­pulosos e chefes de atividades arbitrários quão ditadores; os anúncios e estardalhaços sobre enfermidades devastadoras; os comunicados sobre os danos perpetrados contra a ecolo­gia prenunciando tragédias iminentes; a catalogação de cri­mes e violências aterradoras respondem pela inquietação e pelo medo que grassam em todos os meios sociais, como cons­tante ameaça contra o ser e o seu grupo, levando-os a perma­nente ansiedade que deflui das incertezas da vida.

Passando, de uma aparente segurança, que era concedida pelos padrões individualistas do século 19, no apogeu da industrialização, para o período eletrônico, a robotização ameaça milhões de empregados, que temem a perda de suas atividades remuneradas, ao tempo em que o coletivismo, igua­lando os homens nas aparências sociais, nos costumes e nos hábitos, alija os estímulos de luta, neles instalando a incerte­za, a necessidade de encontrar-se sempre na expectativa de notícias funestas, desagradáveis, perturbadoras.

Esvaziados de idealismo e comprimidos no sistema em que todos fazem a mesma coisa, assumem iguais compostu­ras, passando de uma para outra pauta de compromisso com ansiedade crescente.

A preocupação de parecer triunfador, de responder de for­ma semelhante aos demais, de ser bem recebido e considera­do é responsável pela desumanização do indivíduo, que se torna um elemento complementar no grupamento social, sem identidade, nem individualidade.

Tendo como modelo personalidades extravagantes, que ditam modas e comportamento exóticos, ou liderado por ído­los da violência, como da astúcia dourada, o descobrimento dos limites pessoais gera inquietação e conflitos que mal disfarçam a contínua ansiedade humana.

A ansiedade tem manifestações e limites naturais, perfei­tamente aceitáveis.

Quando se aguarda uma notícia, uma presença, uma res­posta, uma conclusão, é perfeitamente compreensível uma atitude de equilibrada expectativa.

Ao extrapolar para os distúrbios respiratórios, o colapso periférico, a sudorese, a perturbação gástrica, a insônia, o cli­ma de ansiedade torna-se um estado patológico a caminho da somatização física em graves danos para a vida.

O grande desafio contemporâneo para o homem é o seu autodescobrimento.

Não apenas identificação das suas necessidades, mas, prin­cipalmente, da sua realidade emocional, das suas aspirações legítimas e reações diante das ocorrências do cotidiano.

Mediante o aprofundamento das descobertas íntimas, al­tera-se a escala de valores e surgem novos significados para a sua luta, que contribuem para a tranqüilidade e a autoconfi­ança.

Não há, em realidade, segurança enquanto se transita no corpo físico.

A organização mais saudável durante um período, debili­ta-se em outro, assim como os melhores equipamentos orgâ­nicos e psíquicos sofrem natural desgaste e consumição, dan­do lugar às enfermidades e à morte, que também é fenômeno da vida.

A ansiedade trabalha contra a estabilidade do corpo e da emoção.

A análise cuidadosa da existência planetária e das suas finalidades proporciona a vivência salutar da oportunidade orgânica, sem o apego mórbido ao corpo nem o medo de per­dê-lo.

Os ideais espiritualistas, o conhecimento da sobrevivência à morte física tranqüilizam o homem, fazendo que consi­dere a transitoriedade do corpo e a perenidade da vida, da qual ninguém se eximirá.

Apegado aos conflitos da competição humana ou deixan­do-se vencer pela acomodação, o homem desvia-se da finali­dade essencial da existência terrena, que se resume na aplica­ção do tempo para a aquisição dos recursos eternos, propici­adores da beleza, da paz, da perfeição.

O pandemônio gerado pelo excesso de tecnologia e de conforto material nas chamadas classes superiores, com ab­soluta indiferença pela humanidade dos guetos e favelas, em promiscuidade assustadora, revela a falência da cultura e da ética estribada no imediatismo materialista com o seu arro­gante desprezo pelo espiritualismo.

Certamente, ao fanatismo e proibição espiritualista de caráter medieval, que ocultavam as feridas morais dos ho­mens, sob o disfarce da hipocrisia, o surgimento avassalador da onda de cinismo materialista seria inevitável. No entanto, o abuso da falsa cultura desnaturada, que pretendeu solucio­nar os problemas humanos de profundidade como reparava os desajustes das engrenagens das máquinas que construiu, resultou na correria alucinada para lugar nenhum e pela con­quista de coisas mortas, incapazes de minimizar a saudade, de preencher a solidão, de acalmar a ansiedade, de evitar a dor, a doença e a morte...

Magnatas, embora triunfantes, proíbem que se pronuncie o nome da morte diante deles.

Capitães de monopólios recusam-se a sair à rua, para evi­tarem contágio de enfermidades, e alguns impõem, para vi­ver, ambientes assepsiados, tentando driblar o processo de degeneração celular.

Ases da beleza cercam-se de jovens, receando a velhice, e utilizam-se de estimulantes para preservarem o corpo, apli­cando-se massagens, exercícios, cirurgias plásticas, muscu­lação e, não obstante, acompanham a degeneração física e mental, ansiosos, desventurados.

Propalando-se que as conquistas morais fazem parte das instituições vencidas — matrimônio, família, lar — os apani­guados da loucura crêem que aplicam, na velha doença das proibições passadas, uma terapêutica ideal. E olvidam-se que o exagero de medicamento utilizado em uma doença, gera danos maiores do que aqueles que eram sofridos.

A sociedade atual sofre a terapia desordenada que usou na enfermidade antiga do homem, que ora se revela mais de­bilitado do que antes.

São válidas, para este momento de ansiedade, de insatis­fação, de tormento, as lições do Cristo sobre o amor ao pró­ximo, a solidariedade fraternal, a compaixão, ao lado da ora­ção, geradora de energias otimistas e da fé, propiciadora de equilíbrio e paz, para uma vida realmente feliz, que baste ao homem conforme se apresente, sem as disputas conflitantes do passado, nem a acomodação coletivista do presente.